E tudo o tempo levou (e trouxe)
Um dia estamos a secar o cabelo depois do banho e damos conta de que o tempo está irremediavelmente a passar. As rugas na pele são uma realidade com que vamos lidando há algum tempo, e já nos habituamos a elas, mas os longos cabelos brancos que ontem não estavam lá e agora sobressaem... esses são terríveis. Pinto, não pinto, que chatice, eu que odeio cabeleireiros, não tenho pachorra, e não me apetece estar em casa em manobras com tinta do supermercado a dar cabo dos braços... Raios partam na idade, que tudo traz a quem a ela chega... Nunca os nossos problemas de consciência falaram tão alto, como naquele exato momento em que vislumbramos cabelos brancos, várias resoluções adiadas para a idade adulta nos cercam com dívidas de tempo, e temos mesmo que admitir para nós próprios que somos mortais. Acabou-se a ilusão de que velhos são os avós e os senhores que estão nos lares, aquele vizinho de bengala, ou todas as pessoas que eram adultas quando ainda estávamos na escola primária. Velhos somos nós, que já temos filhos a ir para a faculdade, a tirar a carta, a ter idade legal para beber num café, a ganhar todas aquelas aptidões que nos eram exclusivas. Bolas para isto, podiam ter avisado que era assim tão rápido! Daqui a nada acordamos um dia e estamos dependentes de terceiros para calçarmos os sapatos! E a ideia do cabeleireiro a moer-me o juízo... o estar horas de pratas na cabeça a parecer uma galinha a quem deram um choque elétrico com um toalhão gigante cor de rosa a cobrir o tronco, em frente a estranhas que nunca se calam, sempre a dizer parvoíces umas para as outras, a teres que sorrir para não pareceres parvalhona quando contam uma piada labrega... aquele tom de voz colocado para passar por cima do ruído do secador, as perguntas inconvenientes sobre a tua vida, a tua família, o teres de justificar o facto de teres cera nos ouvidos, pior!, seres bombardeada com vendas amadoras de produtos de beleza de catálogo, ou tupperwares... Esqueçam, vou assumir os brancos.
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